Em 2019, quando o Correio Braziliense esteve no Catar para conhecer os preparativos do país-sede para a Copa do Mundo, o técnico catalão Félix Sánchez Bas, oriundo de La Masia, a fábrica de craques do Barcelona, disse que a seleção chegaria à estreia com 12 anos de preparação na bagagem. O comandante responsável pelo título do Copa da Ásia Sub-19 em 2014 da Copa da Ásia dos marmanjos em 2019 viu o planejamento de uma vida ruir em dois minutos neste domingo no primeiro jogo da 22ª edição do principal torneio da Fifa.
Quando Enner Valencia balançou a rede aos dois minutos, a sensação no abarrotado Al-Bayt Stadium era de que a festa iniciada com uma pomposa cerimônia de 30 minutos estava terminando em 180 segundos de bola rolando. Para sorte dos anfitriões, o Árbitro de Vídeo (VAR) detectou impedimento depois de uma paralisação imensa no melhor estilo Brasileirão.
Apesar da demora, houve acerto no lance, para alívio de uma torcida aparentemente fake posicionada atrás da meta defendida pelo goleiro Al-Sheeb. Comportados até demais, os torcedores usando jelaba, a tradicional roupa árabe, escutavam passivamente a torcida do Equador colocar pilha no jogo e tomar conta de cada pedacinho do belíssimo gramado.
Sentindo-se em casa, como se estivesse jogando na altitude de Quito ou ao nível do mar, em Guayaquil, o Equador passeou no meio do deserto do Catar, onde fica a belíssima tenda árabe com capacidade para 60 mil pessoas. Inspirado, Enner Valencia abriu o placar de pênalti. Depois, ampliou usando a cabeça e praticamente resolveu a partida em 45 minutos. O Catar perdeu uma chance clara no fim da etapa inicial, mas sequer finalizou a gol no primeiro tempo.
A etapa final poderia ter sido suspensa devido à queda na qualidade de um jogo de abertura de Copa. O tempo foi passando e o Equador administrou a vitória tão desejada. Afinal, em um grupo com a Holanda favorita, resta, em tese, apenas uma vaga às oitavas. O Equador esteve no mata-mata apenas uma vez, na estreia, em 2006. Com Senegal abatido pela ausência do segundo melhor do mundo, Sadio Mané, cresce a chance de o país avançar ao mata-mata.
Primeiro anfitrião derrotado em um jogo de abertura de Copa do Mundo, o Catar sentiu a estreia. Como se não bastasse a carência de torcida para fazer o fator casa, faltou o futebol exibido nas participações na Copa América de 2019, na Copa Ouro da Concacaf, em 2021, nos Estados Unidos, quando chegou às semifinais, e na conquista inédita da Copa da Ásia contra o Japão, em 2019. A estreia planejada durante 12 anos arrisca fracassar.
Além de entrar para o almanaque como a primeira dona da casa derrotada em um jogo de abertura, o Catar pode repetir a tristeza da África do Sul. Em 2010, os Bafana Bafana até seguraram o México no primeiro jogo, no Soccer City, em Joanesburgo, mas não evitaram o vexame de cair na fase de grupos da competição. Um prejuízo esportivo enorme para quem investiu muito dinheiro para ostentar a Copa do Mundo mais cara da história.